TCAv entrevista: Clarissa Daneluz – egressa do TCAv e autora da obra “Um rosto pede contato” (2021)

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A egressa do TCAv, Clarissa Daneluz participou da exposição on-line “Os dias em que as corujas caíram do céu”, do projeto Verter (UFRGS), com o vídeo “Um rosto pede contato”, produzido a partir de montagens de imagens da pesquisa de sua tese. Clarissa é graduada em Publicidade e Propaganda (UCS), mestre e doutora em Ciências da Comunicação (UNISINOS). Atualmente trabalha como autônoma em serviços de comunicação e artes.

Still da obra Um rosto pede contato
  • Clarissa, poderias comentar brevemente sobre tua pesquisa?

Durante minha pesquisa de doutorado eu busquei investigar qualidades audiovisuais, tecnoculturais, de memória e design, ou seja, audiovisualidades, em imagens de rosto geradas por inteligência artificial, aplicativos, softwares. O objeto empírico foram imagens de rosto que eu coletei tendo como objeto de
estudo potências fabulatórias nesses “rostos-imagens–rostos”, gerados por softwares.

  • Como surgiu a obra  “Um rosto pede contato“? Ela é um spin off da pesquisa?

Motivada pelo convite da professora Marina Polidoro (IA/UFGS) para integrar a exposição “Os dias em que as corujas caíram do céu” (Plataforma Verter (IA/UFRGS) e Wrong Bienal. Marina acompanhou minha banca de defesa de tese e reconheceu algumas proximidades, algumas ligações com trabalhos
artísticos, de viés poético, e também com os autores acionados – Henri Bergosn, Aby Warburg, Walter Benjamin, Georges Didi-Hubernan, Vilén Flusser. Autores que estão presentes na área da Comunicação, na linha das audiovisualidades, mas que estão presentes na filosofia e nas artes também. Reconheço que sempre fui lidando com os matérias de pesquisa sob um viés comunicacional, audiovisual, mas muito estético – filosófico, artístico/poético também. Então para esse convite eu acabei resgatando esses materiais, não sei se é exatamente um spin off da pesquisa, mas acho que é possível; eu acabei fazendo outra coisa, desenvolvendo outro objeto poético, mas sim, acabei voltando para experimentos, ensaios visuais realizados durante a pesquisa de tese. Muitos deles, em algum momento, pensei em inserir no
documento final, mas depois acabei reconhecendo que não era necessário, ou não tinha um vínculo mais pontual com a discussão. Aliás, é comum num processo de doutoramento a gente ter várias ideias, inclusive na nossa linha – nas audiovisualidades – tentar desenvolver um projeto, junto ao pensamento
teórico, um objeto audiovisual. Os experimentos acionados para “Um rosto pede contato” fazem parte desses movimentos que durante a pesquisa pensaram o objeto teórico a partir de gestos poéticos, com vídeos, colagens, animações, etc.

Still da obra Um rosto pede contato

O convite para exposição surgiu também como oportunidade de resgatar esses ensaios e ver o que nesses movimentos de aproximação com o objeto investigado durante a tese estariam conversando de modo mais intenso com o campo das artes, poéticas visuais. Então eu voltei para aquela coleção de imagens (muitas imagens!), e para os exercícios, ensaios que eu tinha feito – montagem, animação, vídeo e escritos de fabulação (diálogos, histórias criadas a partir da interação dos documentos como intercessores). Esse resgate atualizou meus arquivos em “Um rosto pede contato”.

  • Como é lidar com materiais que compõem a pesquisa, mas não integram o produto final da tese?

Seguindo a resposta anterior, e como a própria pergunta já sugere, muitas vezes os materiais que não integram o produto final merecem e são potentes para outros resgates, para outros escritos, outros projetos. Todas as aproximações que eu fiz, leituras, produção escrita, ensaios visuais que não estão diretamente publicados na tese me ajudaram a pensar sobre o objeto. Dessa forma eles integram em outra intensidade e atualidade o documento final. Todo o movimento, todo o material que não se realiza em linguagem no documento, não quer dizer que não esteja ali, que não tenha presença. Mas claro, importa durante o processo de pesquisa reconhecer os materiais que por questão de tempo, de foco do trabalho, e mesmo de força produtiva para atuar de modo mais protagonista, digamos, podem ser acionados em outros momentos, outros escritos. E no meu caso, como material estéticos, poético, tiveram um resgate com nessa exposição.

  • Como foi o processo de produção da obra? O que é possível “ver” da tua pesquisa nela?

Voltando para os meus arquivos, para as minhas coleções de imagens, reunindo esses documentos no computador, fazendo novas montagens, praticamente “manuais”, eu nunca usei softwares de combinação de imagens, foi uma opção também, tentar fazer isso de forma um pouco “analógica”,
digamos, cheguei a fazer montagens, colagens de figuras impressas, recortei e fui fazendo mapas manualmente. Um exemplo desse gesto, exercício, está na tese, mas para essa obra eu acabei acionando as coleções principais e que integram o capitulo três da tese – Estéticas da Representação Facial. Fiz novas colagens, fiz animações no computador, exibi essas animações na TV de casa e fiz um filme da tela de exibição – vídeo do vídeo. E também por isso – conferindo a obra “Um rosto pede contato” – é possível reconhecer certa fantasmagoria pela qualidade da imagem – com padrão moiré, turva – com
rostos que estão ali, mas não são reconhecíveis. Na imagem total esses rostos formam mapas, demarcações, e logo de misturam. É possível fazer associações, com temas /procedimentos /conceitos caros para a pesquisa – cartografias, constelações, mapas, espaços de pensamentos. E essa não nitidez das pequenas figuras que compõem a imagem total ressoa num contato – de onde? de quem? que rostos são esses? são rostos?

  • Como foi o processo para a integrar o catálogo? Como enxergas os diálogos com as demais obras que o compõem?

Para integrar o catálogo foi proposto aos artistas convidados que mandassem imagens de still, da feitura, processo da obra, e informações sobre a proposta. Sendo possível então, através do catalogo, reconhecer por convergência e dispersão diálogos – que não se esgotam – entres as obras. E como arquivo geral da expo e catálogos – alguns pontos importantes ficam em evidência para mim até o momento: coleções de imagens; possibilidades do erro tecnológico como intercessor estético de criação; os limites/fronteiras entre tecnologias midiáticas e outras linguagens; viés arqueológico dos objetos de cada artista. Tem algo que explora ambiências de não fronteira, das possibilidades do erro, da geração de espaços de pensamentos, de intervalos em que algo é criado, inventado, fabulado fora de um super controle de precisão tecnológica e de limites de linguagens.

Clarissa Daneluz – egressa do TCAv e autora da obra Um rosto pede contato
  • O processo de produção da obra te fez refletir outros aspectos da tua pesquisa que, em função de formatos e formatações, ficaram, de alguma forma, soterrados?

Aqui eu volto um pouco para o que eu respondi anteriormente, dentro do TCAV a gente tem a liberdade de, de forma organizada, programada, desenvolver também um produto audiovisual, mas foram escolhas minhas, movidas pelo minha aproximação com o objeto de estudo concentrar no documento teórico, escrito. No mais, algo sempre fica “soterrado”, em processos de investimento de foco teórico, acredito que sempre algumas camadas não acessadas em toda a pesquisa, em todo a experiência. Então, eu ainda estou tão consciente dessas camadas que não vieram a tona durante o curso porque, não era o momento? Não sei. Mas algo sempre fica, nos escombros pra que justamente, eu acho as pesquisas, as nossas atividades como pesquisadores sigam. Alguma coisa sempre fica por ser resgatada, ou fazem emergir em outro momento, com outros olhos, isso também integra a riqueza de um processo de formação, de um doutorado, de uma pesquisa. A gente nunca esgota o objeto e nem as nossas questões como pesquisadores e muito menos as questão levantadas pelas nossas referências. Então há algo sim que ainda de forma muito especulativa eu me atrevo a dizer que fica a na ordem de uma presença midiática do rosto humano entre o palpável e imaterial a partir de uma tipo de “plasticidade reversa” – como essas imagens de rosto geradas por softwares se materializam em rostos físicos. Algo digital se transposta para um ambiente físico a ponto a modificar a ideia/referências de rosto humano.

  • Qual a importância do TCAV e seus conceitos para a obra? E para ti e no teu dia-a-dia?

Total. A possibilidade de eu ter uma formação em comunicação, numa linha que me confere toda um embasamento, uma forca comunicacional sob a ênfase das audiovisualdades – ou seja filosófica, estética, tecnocultural – foi fundamental, não só para essa obra como e fundamental para a minha formação como pesquisadora. como pessoa. Tudo que eu estudei, as aulas que eu tive, os contatos, as trocas com os professores, com o grupo, com os colegas, o acesso aos autores que linha trabalha, Tudo isso ressoa pra sempre. Não só foram autores e experiências que eu lancei mão para desenvolver a pesquisa, finalizar um documento, mas que reconheço na minha formação como um todo. Sou muito grata ao PPG e especialmente ao TCAV, pelo comprometimento e pela seriedade dos professores e por essa linha de pensamento.

  • Algum recado para os tcavianos?

Aproveitem muito o contato com os professores, com os colegas, as aulas. É uma formação muito rica. Reconheçam a força, a potência dessa oportunidade. Estar presente e de fato comprometido com a experiência. Trocar o quanto puderem com os colegas – sempre tem algo que a gente não domina, alguma leitura, ferramenta, etc. Ler o texto do colega, propor e escrever junto mesmo que que seus objetos não tenham, a princípio, similaridade, isso ajuda a compreender a linha como um todo e a expandir a participação individual e do grupo na área. Avante tcavianos!

INFORMAÇÕES DA OBRA

Um Rosto Pede Contato, 2021. Clarissa Daneluz

Local Evento: On-line. Cidade do evento: Porto
Alegre. País: Brasil. Instituição promotora: Laboratório de Imagem e Tecnologia, do
Departamento de Artes Visuais da UFRGS. Tipo de evento: Bienal.

Atividade dos autores: Artista Visual. Temporada: 1° de novembro de 2021 – 1° de
março de 2022. Home-page: https://www.ufrgs.br/prorext/os-dias-em-que-as-corujas-
cairam-do- ceu-e-a-nova-exposicao-da-plataforma-verter

Um rosto pede contato / A face asks for contact consiste em vídeo sobre montagens de
imagens (3”25) a convide da Plataforma Verter (IA/UFRGS)

– Um rosto
– Humano, numérico, quântico?
– Pede contato.

O vídeo resulta de arquivos formados e experimentos de montagem realizados durante
pesquisa de doutorado intitulada “Antiface / rosto imaginário: fabulações nas imagens
geradas por softwares”. Coletar, montar, animar, são gestos que atualizam espaços de
pensamento: a despeito do propósito que informa a imagem de um rosto – detecção,
reconhecimento – que é isto e que deve ser feito com isto? A fabulação tem seus cinzeis de escultor.

Texto: Lucas Mello Ness

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