Anarquivando “NO PAIZ DAS AMAZONAS”

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A discente Simone Barreto de Almeida defendeu sua tese de Doutorado na última quinta-feira, dia 13/07, às 14h, com a pesquisa intitulada “A MEMÓRIA ANARQUIVADA DE “NO PAIZ DAS AMAZONAS” NOS BUSCADORES ONLINE” em banca remota formada pelo orientador Prof. Dr. Gustavo Daudt Fischer (UNISINOS) e pelos avaliadores Prof. Dr. Leandro Pimentel Abreu (UERJ), Prof. Dr. Marcio Telles (UTP), Prof. Dr. Tiago Ricciardi Correa Lopes (UNISINOS) e Prof. Dr. João Ricardo Bittencourt (UNISINOS).

A pesquisadora iniciou sua apresentação estabelecendo os buscadores online como uma forma cultural que produz arquivamentos, tal qual o cinema a tv e o vídeo, por exemplo, e que sua pesquisa passa a chamar de mundos fílmicos.

Assim, o problema de pesquisa formulado segue a pergunta “Como as imagens fílmicas atualizam-se no arquivamento do Google na busca do filme “NO PAIZ DAS AMAZONAS”, de Silvino Santos?”, cujo objetivo geral busca compreender os modos de atualização do filme na web, reconhecendo a forma própria de arquivamento dos buscadores online. A partir daí, a proposta é de cartografar as montagens produzidas por estes buscadores na sua construção de mundos fílmicos para então produzir anarquivamentos das imagens armazenadas pelo Google, desmontando sua própria ordem de arquivamento.

O arranjo metodológico desenvolvido, que teve como base a intuição Bergsoniana, se utilizou de um olhar arqueológico, baseado em flâneries, para se valer das cartografias Benjaminianas, o que permitiu explorar os mundos fílmicos dos buscadores, produzindo imagens de diversas ordens que, mais tarde, foram recombinadas através do procedimento do anarquivamento, que reordena o que antes estava estabelecido como forma de dar a ver as durações das imagens fílmicas da obra em questão sob uma nova perspectiva.

O próprio filme “No Paiz das Amazonas” é reconhecido pela pesquisa como um filme produzido com base em um banco de dados, onde o cineasta Silvino Santos produz sua coleção própria de imagens de maneira a construir a obra. Os arquivos buscados inicialmente tratam tanto do filme quanto do cineasta como um pioneiro do cinema no Brasil, porém, tendo sua busca sido feita inteiramente na Internet, Almeida problematiza o próprio meio, chamando a atenção para como os arquivos foram sendo ali atualizados ao longo do trabalho, produzindo restituições de imagens da memória do filme, onde a ideia de pioneirismo de Santos já passa a ser contestada.

Assim, a pesquisadora identifica como uma tecnocultura da busca as qualidades inerentes aos buscadores de web e as opções que estes permitem ao usuário interagir com eles. Na imagem acima, destaca-se a barra de navegação secundária que foi tratada por Almeida como uma barra de coleções, pois cada item ali descrito produz seu próprio recorte específico (relevante, segundo o Google) para os grupos de imagens e informações que o buscador direciona, relacionando os mundos fílmicos ao que ela chama também de “mundos buscadores”.

É possível, portanto, perceber como os arquivamentos produzidos nestes mundos fílmicos são pensados sempre como uma montagem tecno-estética que constrói, em cada um deles, sua própria ideia de memória. Isso evidencia a estrutura arquivante dos buscadores, que determina o arquivo, ou seja, aquilo que é arquivado e como é arquivado.

Dessa forma, a coleção “Imagens” produz outras sub-coleções, logo abaixo, como “jg araújo”, “dvd”, “filmes”, etc., que, em tese, deveriam refinar a pesquisa feita pelo buscador, mas que no final das contas continua a apresentar o banco de dados tal qual permitido pelas estratégias utilizadas pelo buscador.

Assim, um movimento para dentro das opções do buscador passa a produzir categorias que falam mais sobre ele próprio, evidenciando suas estratégias comerciais e discursivas em oposição ao assunto buscado. Almeida destaca que o Google tem a característica de colecionar as mídias, mas ele não deixa claro que está fazendo isso, utilizando-se de estratégias de bloqueio e interrupções que quebram a circularidade de informações que é construída pelas suas coleções quando uma mídia externa a ele é acionada.

Através de um movimento realizado dentro do buscador do Google, a pesquisadora aponta, então as coleções por ele acionadas, caracterizadas pela construção de um banco de dados que é categorizado, para além de ser arquivado.

Dessa maneira, a pesquisa chega à produção de uma cartografia própria identificada como Memória, Coleção e Aplicativo, construída a partir das imagens que o banco de dados apresentou no percurso executado através do buscador, na tentativa de criar algo que reflita a própria metodologia utilizada, sendo compreendida pelo próprio Google, seja em dispersão pela web.

A pesquisadora conclui falando a respeito do arquivamento produzido pela tecnocultura da busca, reorganizado pelo processo cartográfico que dá a ver o anarquivamentos do filme “No Paiz das Amazonas”, percebendo que o Google e a tecnocultura da busca são molduras que constroem seus próprios sentidos de memória das imagens fílmicas, onde a cultura do arquivo surge como a grande característica de um objeto audiovisual contemporâneo, amplamente baseado na estrutura do banco de dados.

De forma geral, a banca ressaltou a importância que o trabalho tem ao realizar uma revisão a respeito do cineasta Silvino Santos como pioneiro do cinema brasileiro e do próprio documentarismo do séc. XIX, em boa parte atrelado a um processo colonialista que se produz sobre um determinado tipo de arquivamento que é desmontado pela pesquisa.

Além disso, a própria discussão realizada sobre os conceitos de arquivamento, desarquivamento e anarquivamentos são uma contribuição importante para o meio, ainda que em alguns momentos haja a necessidade de deixar mais claras questões que apenas aparecem de maneira implícita a este respeito.

Ficam como possibilidades de continuidade a ideia de explorar, além do conceito de memória, os imaginários em torno da Amazônia, do cineasta em questão e do próprio sistema de busca usado e da sua eficiência em arquivar e acessar determinadas memórias, além de aprofundar a questão da estrutura algorítmica e o quanto ela impossibilita um movimento mais anárquico pelo pesquisador.

Destacando o enorme esforço empregado no trabalho, evidenciado pela relação do pesquisador com a pesquisa, num movimento que transformou ambos, a banca decidiu por aprovar a discente, concedendo a ela o grau de Doutora pelo PPGCOM Unisinos.

Texto: Augusto Bozzetti.

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