Audiovisualidades Paikianas

Na sexta-feira, 28 de abril de 2023, às 14h, ocorreu a banca de defesa da tese de doutorado da discente Aline Corso, intitulada “Audiovisualidades Paikianas: uma Arqueocartografia por Artefatos da Tecnocultura Audiovisual Contemporânea em Ambientes On-line”. A banca ocorreu no formato online e foi composta pelos professores Prof. Dr. Tiago Franklin Rodrigues Lucena (UEM), Profa. Dra. Débora Aita Gasparetto (UFSM), Prof. Dr. Tiago Lopes (UNISINOS), Prof. Dr. João Ricardo Bittencourt (UNISINOS) e Dr. Gustavo Daudt Fischer (Orientador).

Sua pesquisa busca compreender “como as audiovisualidades paikianas – entendidas como uma qualidade audiovisual que é autenticada a partir da percepção das durações (éticas, estéticas e técnicas) na obra arte-midiática de Nam June Paik – se atualizam em artefatos da tecnocultura audiovisual contemporânea em ambientes on-line?”. A intenção de Aline é estudar a presença de Nam June Paik a qual, na comunicação contemporânea e nos processos midiáticos, apresentou indagações sobre essa natureza comunicacional imagética que parecia durar nas atualizações em diferentes mídias.

Com isso, seu trabalho parte de três perspectivas teóricas: tecnocultural (Qual a interseção da tecnologia com a sociedade, ciência, arte, corpo e modos de comunicação? Como envolver a comunicação e fazer durar materiais culturais em contextos tecnológicos); imagética (o que é e qual o papel da imagem na criação artística e na memória?); memorial (como pensar a memória em nossa tecnocultura audiovisual e softwarizada?).

Para isso, realizou-se uma busca por essa qualidade no meio internet, com compreendendo essas imagens técnico culturais como potencializadoras de discursos midiáticos e do devir, que constitui o imaginário técnico cultural de uma época. Como objetivo geral, portanto, a pesquisadora propõe uma arqueocartografia, escavando audiovisualidades paikianas e suas atualizações em artefatos da tecnocultura audiovisual em ambientes on-line.

Ao se deixar afetar pelo que estava vendo em suas movimentações, Aline desenhou um arranjo tecnometodológico, o qual passou a chamar de ‘arqueocartografia’, unindo assim duas metodologias: cartografia e arqueologia das mídias. Além disso, teve como suporte o uso de pranchas de imagens wanrburguianas. A partir dessa perspectiva, a pesquisadora passa a entender os meios, as mídias, os artefatos, como corpos dotados de memória que, ao serem vasculhados, revelam outros modos de agir, sentidos e possibilidades. Referente ao percurso operacional da tese, a discente o fez no percurso do próprio pesquisar, sendo inspirada pela ideia de ‘random access’, do próprio Nam June Paik.

Foram realizados dois giros arqueocartográficos, sendo estes movimentos não lineares de ingresso nos ambientes online – solo este em que a pesquisadora escavou artefatos, objetos, meios, aparatos, imagens, etc. O primeiro giro “Nam June Paik”, Aline persegue os rastros que Paik deixou ao seguir sua trajetória na Coreia, Japão, Alemanha e Estados Unidos, dividindo seus achados em cinco períodos (de modo cronológico). Nesta etapa de sua pesquisa, a discente relaciona 35 obras do artista, de modo que seria uma prancha, um pensamento visual, situando a sua obra num caráter histórico e imagético. No final desse primeiro giro, a ideia do que era uma audiovisualidade “paikiana”, passa a tomar forma: são todas as virtualidades estéticas, técnicas discursivas, culturais que englobam os temas globalismo, participação, imprevisibilidade, dualidade, comunicação, coexistência, informação, aleatoriedade, experimentação, ludicidade, humor, zen, ironia, tempo, memória, provocação, vigilância, política, religiosidade, fluxo, multiplicidade, multissensorialidade, hibridismo, virtualidade, ilusão, manipulabilidade e mutabilidade e seguem se atualizando em outras obras do próprio artista.

O segundo giro arqueocartográfico é a própria atualização dos ambientes online: ao investigar essa atualização para além dela mesma, ou seja, como Paik continua durando em outros artefatos tecnoculturais, Aline captura algumas potencialidades que se caracterizam como criações individuais criativas, buscando compreender suas linguagens, configurações, usos, apropriações, no solo internet. Dessa forma, o objetivo foi perceber suas permanentes mudanças que duram enquanto memória em suas zonas de problematização. Esse movimento resultou em duas coleções de imagens: “Paik revelado nas imagens” e “Paik emanado das imagens”.

É a partir da segunda coleção de imagens que Aline passou a ver emergir algumas tensões e, assim que essas imagens se chocam, elas são iluminadas e daí se concebem as constelações (ou imagens dialéticas). Assim, as quatro constelações que emergiram a partir da coleção “Paik emanado das imagens” foram criadas nesse “sujar as mãos com os empíricos”, enunciado daí sentidos éticos, estéticos, técnicos às audiovisualidades paikianas. Cada uma das constelações foram nomeadas a partir de algumas características partilhadas com processos e manifestações culturais da Coreia do Sul – terra natal de Nam June Paik, sendo elas:

Hanok: a (De)regenerabilidade de Paik. Apresenta um debate que já estava presente desde o começo da pesquisa, que são os problemas e desafios acerca da preservação da artemídia. É feita uma reflexão sobre as questões técnicas de obsolescência de software, deterioração de hardware, ações de degeneração que podem ser revertidas através de estratégias de regeneração (como armazenamento, emulação, migração etc.). Em função disso, Aline pega emprestada essa ideia de degeneração/regeneração para pensar em uma (de)regenerabilidade, enquanto uma capacidade de atualização dessas obras.

Bibimbap: “tudo junto e misturado”. Originalmente, o bibimbap é um alimento que se constitui em uma mistura, então essa constelação irá falar sobre combinações, misturas criativas de diversos elementos técnicos, estéticos, filosóficos, culturais, sociais, mídias, pessoas.

Newtro: “procurando o novo no velho”. Essa sendo a constelação mais influente de todas, não apenas por ter agregado um maior número de artefatos coletados, mas por ter acionado algumas reflexões instigantes acerca da relação entre o antigo e o novo, trazendo, assim, pistas para pensar marcas de ordem tecnostáslgica sob o guarda-chuva da arqueologia das mídias.

Ppalli Ppalli: um mundo acelerado. Nessa constelação demonstrou-se que a situação tecnológica atual pode ser entendida enquanto um processo que acelera o ciclo ou a velocidade das mudanças sociais existentes e, ao mesmo tempo, transforma e afeta instituições culturais e humanas – bem como as condições do mundo cotidiano que costumava se mover em um ritmo relativamente mais lento.

Para Aline, na tecnocultura contemporânea as audiovisualidades paikianas são, portanto, atualizações das memórias das obras de Paik que estão em devir nos ambientes online. Essas apropriações, nessa convergência múltipla de formatos, suportes e tecnologias, se mostram cada vez mais difusas e perpetuam a memória de Nam June Paik. É através dos achados no segundo giro arqueocartográfico que a pesquisadora constata que as audiovisualidades paikianas duram e se (de)regeneram por meio de uma mistura de diversos elementos técnicos, estéticos, filosóficos, culturais e sociais, dando a ver especialmente traços de nostalgia, experimentação, colaboração, nos provocando a pensar sobre a exposição saturada de informações audiovisuais esquizofrênicas.

Avaliação

De modo geral, o trabalho foi muito bem recebido e elogiado de modo unânime pela banca avaliadora. Alguns pontos em destaque apontados pela banca foram: a ótima organização, fluidez do texto e revisão da estrutura do trabalho; a atualidade da pesquisa e a sua articulação da abordagem histórica, apresentando uma sistematização que se torna o ponto chave do trabalho; a importante contribuição tecnometodológica que o trabalho apresenta; a relevância da pesquisa para a área da Comunicação; um trabalho que denota muito esforço, não apenas pelo volume das páginas, mas as derivas, os giros, todo o planejar e as viagens, tudo que foi feito, o esforço de sistematização é louvável.


Texto: Camila de Ávila

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