“O terror found footage representa nossa relação ambivalente com a imagem”- Entrevista com Xavier Aldana Reyes

O terror found footage é um dos temas que será abordado durante a 18a Semana da Imagem na Comunicação por Xavier Aldana Reyes, professor da Universidade Metropolitana de Manchester e fundador do Centro de Estudos Góticos de Manchester, doutor em Literatura Inglesa pela Universidade Lancaster e mestre em em Literatura Moderna e Contemporânea pelo Birkbeck College da Universidade de Londres. Como forma de aproximação das questões que serão tratadas durante a palestra de Xavier hoje, dia 16/11 às 17h, o pesquisador concedeu uma entrevista à integrante do Grupo TCAv, Amerian Aurich:

TCAV: Em seu livro Digital Horror: Haunted Technologies, Network Panic and the Found Footage, os perigos e os medos na era digital são explorados; você acredita que a internet e as redes sociais influenciaram não apenas na narrativa, mas também na estética dos filmes de terror contemporâneos?

XAVIER: O terror found footage possui uma longa e variada história que remonta a pseudodocumentários, mas que se adaptou rápido e bem à era das telecomunicações e das redes sociais. Faz todo o sentido que, em um ano marcado pelo lockdown e pelo isolamento causado pela pandemia, o destaque seja o desktop horror Host (2020), que acontece inteiramente no Zoom e cujos eventos registram uma predestinada sessão espírita online. O terror é ótimo para sondar o lado negro do comum, neste caso a internet e o software, que nos permite comunicar uns com os outros em um momento em que fazê-lo pessoalmente se revelou um desafio. O found footage está interessado em borrar as linhas entre a realidade e a ficção, em falso verossimilhança, então as antigas câmeras de vídeo foram trocadas pelas,  prontamente disponíveis nos últimos anos, câmeras de celular e webcams. A dinâmica permanece a mesma, assim como o interesse em explorar os perigos da tecnologia. Cada vez mais, como defendo nas questões da Semana da Imagem, eu vejo ainda outra mensagem competindo por atenção aqui: a insegurança da imagem em uma década dominada pelo populismo e pelas notícias falsas. Em termos de narrativa, os desktop horror são exercícios multitarefa fragmentados que destacam como as novas mídias e a internet requerem nossa atenção constante e, mais importante, um exame cuidadoso.

TCAV: Tradicionalmente, as imagens de arquivo foram e continuam sendo utilizadas pelas mídias (jornais, documentários, etc) como informativos ou expositores de uma realidade. Como você percebe o papel e o potencial dos arquivos nos filmes de terror found footage, que são estruturados – em sua maioria – a partir de materiais pré-existentes?

XAVIER: Essa é a principal diferença entre o found footage e o terror found footage. O primeiro é composto de filmagens existentes que foram editadas em conjunto, às vezes manipulado, para criar novas paisagens afetivas e significados artísticos. O terror found footage, com algumas exceções que borram as linhas entre atuação e realidade, tem como premissa uma versão aparentemente “fiel” da realidade que sabemos ser falsa desde o início. Este é, obviamente, o caso de todo cinema de ficção, mas a ilusão é intensificada para o terror found footage. Os espectadores assistirão a um terror found footage com pleno conhecimento de que, apesar de suas reivindicações de veracidade, é em última análise uma invenção. A pretensão de realidade e imersão, ao invés de um simulacro de realidade que substitui a coisa real, são alguns de seus principais prazeres. A edição é importante, não apenas para fins de suspense, mas também em termos de “credibilidade” da história e da situação dos personagens. Para voltar ao ponto anterior, acho que o interesse na mão que manipula a imagem (às vezes evidente, às vezes não) aponta para a nossa consciência contemporânea da vulnerabilidade da informação a ser reinterpretada para ganho pessoal, financeiro ou político. O found footage e o terror found footage ambos sugerem que as narrativas não são os fatos (o filme ou as imagens) em si, mas a ordem em que são apresentados.

TCAV: Para você, quais são as principais contribuições do terror found footage na mudança da nossa forma de ver e estudar as imagens?

XAVIER: Terror e tecnologia sempre andaram de mãos dadas. Como gênero, sempre foi rápido em saltar de um meio predominante para outro (da literatura e teatro para a tela e rádio, e para meios mais interativos de narração), e sempre mediou o próprio medo subjacente às principais inovações tecnológicas. Consequentemente a canalização de fantasmas através de telefones, ondas de rádio, aparelhos de televisão e, recentemente, a Internet. Nesse sentido, o terror found footage é apenas um tipo moderno de terror que encapsula os riscos da tecnologia audiovisual, que se tornou um dos modos de comunicação predominantes no século XXI. O terror found footage parece apontar para a fragilidade da imagem da internet e sua suscetibilidade à má interpretação deliberada e manipulação. O exemplo recente de falsos vídeos alegando fraude eleitoral na eleição dos EUA captura muito bem essa ideia. Eu acho que o terror found footage representa nossa relação ambivalente com a imagem. Nós possuímos ambos: uma imensa crença em sua capacidade de capturar a “verdade”, mas ao mesmo tempo desconfiamos dela porque ela se tornou totalmente não confiável.

Fonte: Medium Teorizadah

Para saber mais a respeito deste e de outros tópicos, acompanhe a 18a Semana da Imagem na Comunicação, que acontece entre os dias 16 e 19 de novembro. A palestra de Xavier será “The what and why of found footage horror”, na segunda-feira, dia 16 de novembro às 17h, via streaming. Não perca!

Tradução: Amerian Aurich

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